O Caminho para a Iluminação

 Palestra dada por Tan Ajahn Suchart para um público leigo em 22/8/2007. 



Deixe-me começar por receber todos a Tailândia e ao budismo. O budismo é o ensinamento do Buda
uma pessoa iluminada que sabe o que não sabemos e vê o que não vemos, ou seja, a mente, a outra
metade de nós mesmos. Nós só vemos nosso corpo, mas não vemos a mente. Nós não sabemos o que é a mente e não sabemos como fazer nossa mente feliz. Em vez disso, tendemos a fazer o oposto. Fazemos nossa mente infeliz o tempo todo. Ficamos preocupados, ansiosos e inquietos. Nós não sabemos como cuidar da nossa mente. Nós nem sabemos que temos uma mente para cuidar. Então só cuidamos do nosso corpo e dos nossos desejos. É aí que está o problema. Não sabemos o que a mente precisa, o que faz a mente feliz. Precisamos de alguém como o Buda para nos dizer. Se acreditarmos nele e seguirmos seus ensinamentos, então nossa mente sempre será feliz e contente.
O budismo surgiu da iluminação do Buda. Depois que o Buda se iluminou, ele espalhou este conhecimento para outras pessoas. As pessoas que ouviram e tomaram seu ensino acabaram se tornando iluminadas. Eles depois ajudaram a disseminar ainda mais esse conhecimento até hoje.
O budismo tem agora 2550 anos de idade. Por que o budismo ainda é prático e útil hoje? É porque pode nos ensinar a encontrar o que procuramos, que é felicidade e contentamento, enquanto nada mais neste mundo pode.
Não importa quanto dinheiro tenhamos, ainda estaremos com fome e queremos mais. Nunca encontraremos contentamento ou libertação  do estresse, ansiedade, preocupação e medo, porque
nós não sabemos como fazer isso.
O que devemos saber é que nossa existência, nossa vida, é composta de duas partes: o corpo e a mente. O corpo é o servo, enquanto a mente é o mestre. Antes do corpo pode fazer qualquer coisa, como ficar em pé, andar, ir aqui e ali, primeiro tem que ser comandado pela mente.
Por exemplo, primeiro a mente tem que pensar que você quer vir para a Tailândia. Então seu corpo começa a fazer os preparativos, providenciando seu passaporte, visto e dinheiro. A mente inicia todas as nossas ações físicas e verbais, que podem ser boas, ruins ou nem boa e nem ruim. Uma boa ação gera sentimentos de paz e felicidade. Uma má ação cria estresse, ansiedade, preocupação, agitação e inquietação. Ação que não é boa nem ruim não produz bons nem maus sentimentos. Estes são os três tipos de ações que são iniciadas pela mente.
Boa ação é quando pensamos em fazer algo bom para outras pessoas, como ajudar alguém ou comprar
um pedaço de bolo para o aniversário do seu amigo. Isso faz você e seu amigo se sentirem bem. Esta é uma boa ação. Má ação é quando você magoa alguém, como roubar a câmera de seu amigo. Isso faz você se sentir mal e preocupado em ser pego. Seu amigo também se sente mal. Esta é uma má ação resultando em sentimentos ruins. Ação que não é boa nem ruim é quando você não machuca nem ajuda outras pessoas, como comer, exercitar e dormir. Estes três tipos de ações são chamadas kamma: ações do corpo, fala e mente. A ação mais importante é a ação mental, o que você pensa. O Buda, portanto, nos ensina a observar nossa mente e pensamentos e orientá-los à direção correta, a boa direção. Toda vez que você quer fazer algo bom, você deveria fazer isso imediatamente. Não espere. Toda vez que você quer fazer algo ruim, você deve parar imediatamente porque vai machucar a si a outras pessoas.
O Buda ensina o caminho para a perfeita paz da mente, estar livre de sentimentos ruins em três estágios: caridade, moralidade e desenvolvimento mental. A caridade consiste em ser generoso, ajudar os outros. Dê o que você não precisa e mantenha o que precisa. Ao invés de gastar seu dinheiro em itens de luxo ou saindo, algo que não lhe beneficia mentalmente, você deve dar esse dinheiro para caridade. Isso fará lhe feliz e contente.
Moralidade é abster-se de ferir os outros ao observar os cinco preceitos:

1. Abster-se de matar outros seres vivos, seja animais ou seres humanos.

2. Abster-se de roubar ou possuir coisas que não pertencem a você.

3. Abster-se de má conduta sexual, como adultério. Você deve ter um parceiro de cada vez, um marido ou uma esposa.

4. Abster-se de contar mentiras. Você deve dizer a verdade. Se você não pode dizer a verdade, fique quieto.

5. Abster-se de tomar coisas que irão intoxicar seu mente, como bebidas alcoólicas ou drogas, porque você não vai ser capaz de observar e controlar seus pensamentos ou distinguir bom do mal, certo do errado.

Estes cinco preceitos protegerão você de se meter em problemas, tanto externamente como internamente. Exteriormente, você não vai ter problemas com outras pessoas, com a lei ou com a polícia. Interiormente, você não se preocupará nem terá medo de que será pego ou punido pelo que fez.
O desenvolvimento mental é tornar sua mente mais elevada e melhor. Agora sua mente está instável. Você é continuamente bombardeado por todos os tipos de emoções. Um dia você se sente bem, e no dia seguinte se sente mal. Às vezes você fica bravo; às vezes está triste às vezes está feliz. Você não pode controlar estes emoções. Ao desenvolver sua mente, será capaz de controle sua mente e emoções. Eventualmente você estará sempre em paz e feliz.
O desenvolvimento mental é dividido em duas partes: calma e percepção. Primeiro você acalma a mente, indo para um lugar quieto e isolado, sentado de pernas cruzadas na posição de lótus, fechando os olhos e concentrando-se em um objeto de meditação para evitar que sua mente pense sobre outras coisas. Se a mente continua pensando, não vai ficar quieta, calma e estável. Quando você pensa em algo que não gosta, você se sente mal. Se você pensa em algo que gosta, você vai querer isso. Você não ficará quieto e pacífico. Você pode ser pacífico somente quando parar de pensar. Você pode fazer isso concentrando sua mente em um objeto de meditação, como sua respiração. Esteja apenas consciente de sua respiração. Quando você respira, saiba que está respirando. Quando você expira, saiba que está expirando. Apenas esteja ciente de sua respiração, não deixando sua mente pensar em outras coisas.
Para evitar adormecer você deve sente-se com a coluna ereta, mas relaxado. Não fique tenso. Coloque as mãos no colo, palma para cima, a mão direita sobre sua mão esquerda, feche os olhos e apenas observe a sua respiração. Concentre sua atenção na ponta do seu nariz onde o ar entra em contato quando entra e sai. Faça o esforço para não pensar em outras coisas. Se a mente vaguear, retorne o foco para sua respiração. Ao inspirar, saberá que está inspirando. Ao expirar, saberá que estará expirando. Apenas fique atento se você está inspirando ou expirando, se o ar é grosso ou sutil. Apenas esteja ciente disso.
Não force sua respiração. Seja natural. Não pense no passado, nas coisas que aconteceram esta manhã
ou ontem, nem do futuro, coisas que vão acontecer amanhã. 
O objetivo da meditação de calma é livrar-se do seu pensamento. Se você persistir em sua concentração, mais cedo ou mais tarde, sua mente se tornará gradualmente mais e mais calma e, eventualmente, vai cair no estado de concentração que se parece como cair em um poço, onde há a interrupção de pensamentos. Depois de ter atingido esse estado, não precisa mais se concentrar em sua respiração porque você alcançou seu objetivo. Por mais que você possa permanecer nesse estado, apenas deixe-o em paz. Para a maioria dos iniciantes a mente permanecerá apenas brevemente, talvez apenas alguns segundos e depois se retirará desse estado.
Enquanto você estiver nesse estado, você sentirá uma sensação de paz, felicidade e libertação de todos os tipos de ansiedades e preocupações. Todas as emoções irão desaparecer. Sua mente estará clara como água parada.
Se você puder fazer isso, saberá como limpar a mente quando se sentir mal. Não é bom ficar preocupado ou triste com coisas externas porque você não pode fazer nada sobre elas de qualquer maneira. Você não pode controlar as coisas ao seu redor. Elas podem deixar você louco, triste, preocupado e infeliz. Com a meditação você pode eliminá-las, concentrando-se em sua respiração
e esquecendo as coisas que te incomodam. Você pode permanecer calmo e feliz por um tempo. Mas  não pode permanecer em meditação o tempo todo, você terá que sair e enfrentar o mundo, enfrentar seus problemas e suas responsabilidades. Você pode enfrentá-las com calma se tiver insight, entendendo a natureza das coisas ao seu redor. Todos elas têm três características comuns:
A primeira é a impermanência. Todas as coisas são impermanentes, instáveis e em constante mudança. Por exemplo, nosso corpo não permanece o mesmo. A cada segundo ele está vagarosamente mudando. Estamos ficando mais velhos e mais velhos o tempo todo.
Se você não acredita em mim, veja uma foto sua de dez anos atrás e olhe para si mesmo agora,
e você verá que não é o mesmo. É o mesmo corpo que gradualmente evoluiu para o que você é
agora. Não permanecerá porque dez anos se passaram e naturalmente vai parecer diferente de hoje. Isso é impermanência ou mudança. Tudo ao nosso redor muda, não apenas as pessoas mas as coisas materiais também. Quando você compra algo, é novo. Depois de um tempo, ele se torna velho e eventualmente quebra. Quando você compra um relógio ou um rádio, por exemplo, depois de alguns anos, você terá que levá-lo para a assistência técnica. Se estiver além do reparo, terá que jogar fora.
Você deve contemplar sobre a impermanência constantemente. Diga a si mesmo que tudo o que você tiver em sua posse não durará. Depois de saber isso, você estará preparado para enfrentar a eventualidade de que as coisas mudam de bom para mal. Você não será afetado emocionalmente. Se sentirá como se nada tivesse acontecido porque você sabia antecipadamente que isso aconteceria. Tudo ao seu redor, incluindo o seu corpo, não é estável, mas está sempre mudando.
Você não sabe quando vai ficar doente. Mas se você estiver preparado para ficar doente, não ficará infeliz. Você só vai tomar algum medicamento ou consultar um médico. Se você vai ficar bem ou não, isso não vai incomodá-lo. Você dirá a si mesmo: é assim que é. Sua mente não será afetada pelas doenças do corpo.
A segunda característica é dukkha ou sofrimento. Tudo o que você tiver acabará por machucá-lo. Por exemplo, suponha que você é solteiro e acha que ter um namorado ou namorada vai te fazer mais feliz. Mas isso não é o caso. Porque depois que você se casar, vocês inevitavelmente vão brigar e ficar chateados. Tudo é assim. Elas vão fazer você triste e miserável mais cedo ou mais tarde. Elas não te farão sempre feliz. Existem dois lados para uma história - não apenas o lado bom, mas também o lado ruim. O Buda nos ensinou a olhar para o outro lado da história também. Quando você sabe de antemão o que vai acontecer, vai mudar de ideia. Você optará por permanecer solteiro quando descobre que a miséria supera a felicidade.
A terceira característica é anattā ou não-eu. Não há um eu em nada. Tudo é sem ego, como
este buquê de flores ou este barraco ou seu corpo. O Buda diz que eles são apenas a composição dos
quatro elementos: líquido, sólido, gás e calor. Em outras palavras: terra, água, vento e fogo. Seu corpo vem da comida que você come, que por sua vez vem dos quatro elementos. Eles são todos elementos: dióxido de carbono, oxigênio, hidrogênio e assim por diante. Não existe eu no corpo. Se vocês dissecá-lo, não vai encontrar um eu neste corpo. É a ilusão da mente que cria a percepção de que existe um eu neste corpo. Este corpo sou "eu". Este corpo é "meu eu". O Buda diz que isso não é
a verdade  e sim que é uma ilusão. A verdade é que não existe "eu."
Para ver esta verdade, você tem que meditar até sua mente descansar totalmente em paz, em plena concentração. Quando isso acontece, a mente e o corpo vão temporariamente se separar. A sensação de que existe um corpo desaparecerá da mente. Durante esse tempo, há apenas a mente por si só - o conhecimento está lá, mas não há nada para conhecer. 
Agora você tem o corpo em sua consciência, mas quando você medita até a mente entrar completamente em concentração, ela será temporariamente separada das portas do sentido e seus objetos, da vista, som, cheiro, gosto e objetos tácteis, dos olhos, ouvidos, nariz, língua e corpo.
Você então verá que sua existência é composta de duas partes: a parte física que é o corpo e a parte mental que é a mente. A parte física é impermanente, enquanto a parte mental é permanente.
Um dia, este corpo vai se desintegrar, retornando de onde veio. O elemento água vai voltar para a água o elemento água. O elemento vento vai voltar para o elemento vento. O elemento fogo retornará ao elemento fogo. O elemento terra retornará ao elemento terra. A mente vai continuar para uma nova existência impulsionada pelos três desejos, ou seja, desejo por prazeres sensuais, desejo por ser e desejo por não-ser.
Mas se a mente percebe que nascer de novo é doloroso e miserável, ela vai se esforçar para cortar os três desejos para parar de nascer de novo. Fazer isso não é aniquilação porque a mente é indestrutível. É um dos seis elementos básicos do universo chamado de o elemento de conhecimento. Os outros cinco elementos são terra, água, vento, fogo e espaço. Todos os seres sencientes são constituídos por estes seis elementos, enquanto todos os objetos inanimados são compostos de apenas cinco elementos, sem o elemento do conhecimento.
A culpada aqui é a nossa ilusão que impede a mente de ver as três características de impermanência, dukkha ou sofrimento, e anattā ou não-eu, fazendo com que ela cobice ou se apegue a seja lá com o que entrar em contato. Se temos algo, nos apegamos a isso e queremos que  dure e permaneça conosco para sempre. Mas nada dura para sempre. Quando nos deixa ou muda, ficamos tristes. Quando ainda está conosco, estamos preocupados perguntando quando nos deixará.
O Buda, portanto, nos ensinou a olhar para essas três características. Uma vez que somos capazes de vê-las, deixaremos de lado nosso apego. Então o que acontecer não nos causará nenhuma dor. Nós estaremos sempre à vontade, em paz com tudo, independentemente do que acontecer.
Este é o objetivo do budismo, que é ensinar a mente a deixar tudo de lado, não se apegar a nada, saber que nada dura para sempre, que tudo não é realmente bom para nós e não nos fará felizes. As coisas não nos pertencem. Eles não são nós. Eles não têm ego. O eu é apenas ilusão da mente. Quando vemos isso,  vamos deixar tudo ir. Nós então viveremos em paz.
Não importa o que aconteça, já sabemos e teremos abandonado. Não nos importamos com o que acontece. Podemos viver sem isso. Mas nós temos que fazer estes três estágios de prática, a saber: caridade, moralidade e desenvolvimento mental.
Seja caridoso. Não guarde o que você não precisa. Possua só o que você precisa para sua existência, como os quatro básicos requisitos da vida: comida, abrigo, roupas e remédios. Qualquer coisa além disso é considerada um excedente. Quanto mais você tem, mais problemas, preocupações e problemas mentais e estresse você terá. Viva de forma simples; tenha o mínimo possível.
Você não deve buscar a felicidade que surge ao adquirir dinheiro e coisas materiais. Você deveria buscar a felicidade que resulta de doar o seu dinheiro e posses porque é a verdadeira felicidade sem qualquer ansiedade ou estresse.
Viva uma vida de virtude. Evite fazer qualquer coisa que machuque outras pessoas e, portanto, em troca se machuca, deixando você preocupado e com medo.
Pratique meditação. Controle sua mente para sempre ficar calmo e não se preocupe com nada dizendo
para si mesmo que não há nada para se preocupar porque tudo o que vai acontecer vai acontecer. Você não pode agarrar-se a qualquer coisa. Você nem sempre pode fazer do seu jeito.
Se puder fazer isso a todo momento, será capaz de controlar sua mente e emoções. Este é basicamente o núcleo do ensinamento do Buda.

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