Pequeno guia de estudo do Sabbasava Sutta
Majjhima Nikaya 2
Sabbasava Sutta
Todas as Impurezas
Guia de estudo
As impurezas (asava), são uma categoria de contaminações que existem no plano mais profundo e básico e que sustentam o ciclo samsárico.
Neste sutta, o Buda explica a um grupo de bhikkhus como estabelecer controle sobre as impurezas, que são classificadas em três categorias: desejo por prazeres sensuais; desejo por ser/existir e a ignorância.
O controle está dividido em cinco categorias: virtude, atenção plena, energia e paciência.
O discurso inicia com o Buda deixando claro que as impurezas são removidas somente por aquele que sabe e que vê, não o contrário.
E o que caracteriza alguém que sabe e que vê e que não sabe e que não vê?
É a atenção com sabedoria e a atenção sem sabedoria.
“Quando alguém aplica a sua atenção sem sabedoria, as impurezas que ainda não surgiram, surgem e as impurezas que já surgiram, aumentam. Quando alguém aplica a sua atenção com sabedoria, as impurezas que ainda não surgiram, não surgem e as impurezas que já surgiram, são abandonadas.”
Segundo o Comentário, atenção com sabedoria (yoniso manasikara) é descrita como a atenção com os meios corretos (upaya) e na direção correta (patha). É explicada como diligência, consideração ou preocupação mental que está de acordo com a verdade, isto é, atenção para com aquilo que é impermanente como impermanente, etc. Atenção sem sabedoria (ayoniso manasikara) é a atenção com os meios incorretos e na direção incorreta (uppatha), contrária à verdade, isto é, atenção para aquilo que é impermanente como permanente, o doloroso como prazeroso, aquilo que é não-eu como sendo eu e o que é feio como bonito. MA nos informa que a atenção sem sabedoria se encontra na raiz do ciclo de existências pois ela faz com que o desejo e a ignorância aumentem; a atenção com sabedoria se encontra na raiz da libertação do ciclo de existências pois ela conduz ao desenvolvimento do Nobre Caminho Óctuplo. MA resume esta passagem do sutta desta forma: a destruição das impurezas é feita por aquele que sabe como estimular a atenção com sabedoria e que cuida para que a atenção sem sabedoria não surja.
Fica claro que o primeiro item do Nobre Caminho óctuplo, Visão Correta (samma dithi) é bastante crítico, pois somente através da visão correta é possível enxergar a Verdade e caminhar em direção a Nibanna. Sem ele, não há como abandonar as impurezas e enxergar a Verdade.
O Buda prossegue explicando os métodos de abandono das impurezas de acordo com suas características:
- visão
- autocontrole
- uso
- paciência
- evitando
- remoção
- meditação
Impurezas que devem ser abandonadas pela visão
A palavra “visão” (dassana) neste caso se refere ao primeiro dos quatro caminhos supramundanos – o caminho de quem entrou na correnteza (sotapattimagga) – descrito dessa forma porque proporciona o
primeiro vislumbre de Nibbana.
Novamente cabe destacar a importância da Visão Correta e da realização do fruto de Sotapanna, pois sem elas, a pessoa está fadada a permanecer no samsara indefinidamente.
Aqui, a atenção daqueles que não são treinados no Dhamma dos Nobres é voltada para coisas que não merecem atenção, ou seja, a pessoa dedica sua atenção e sua energia para aquilo que não é benéfico e não leva a realizações espirituais, como por exemplo, desejo por sensualidade, desejo por ser/existir e
ignorância.
De acordo com o Buda, a atenção para estas coisas faz com quem estas impurezas que não surgiram, surjam e as impurezas que já surgiram, aumentem.
A falta de sabedoria faz com que a pessoa entre em uma espiral de questionamento e reflexões inadequadas e que são bastante comuns:
‘Eu existi no passado? Não existi no passado? O que fui no passado? Como eu era no passado?
Tendo sido que, no que me tornei no passado? Existirei no futuro? Não existirei no futuro? O que
serei no futuro? Como serei no futuro? Tendo sido que, no que me tornarei no futuro?’ Ou então
ela está no seu íntimo perplexa acerca do presente: ‘Eu sou? Eu não sou? O que sou? Como
sou? De onde veio este ser? Para onde irá?’
Tendo sido que, no que me tornei no passado? Existirei no futuro? Não existirei no futuro? O que
serei no futuro? Como serei no futuro? Tendo sido que, no que me tornarei no futuro?’ Ou então
ela está no seu íntimo perplexa acerca do presente: ‘Eu sou? Eu não sou? O que sou? Como
sou? De onde veio este ser? Para onde irá?’
Estes questionamentos, segundo o Buda, fortalecem a ideia de um Eu, de uma entidade eterna, imutável, que experimenta os fenômenos. Afastando assim a pessoa da Visão Correta.
Ele prossegue na crítica:
“Essas idéias especulativas, bhikkhus, se denominam um emaranhado de idéias, uma confusão de idéias, idéias contorcidas, idéias vacilantes, idéias que agrilhoam. Aprisionado pelas ideias que agrilhoam, a pessoa comum sem instrução não se vê livre do nascimento, envelhecimento e morte, da tristeza, lamentação, dor, angústia e desespero; ela não se vê livre do sofrimento, eu digo.”
Após demonstrar como um ignorante enxerga o mundo, o Buda explica a visão de um sábio treinado no Dhamma.
Em resumo, podemos dizer que ele não se ocupa com coisas que não merecem atenção e se ocupa com coisas que merecem atenção, repetindo o mesmo padrão do texto sobre o ignorante, ou seja, ele não dá atenção e nem se ocupa com desejo sensual, desejo por ser/existir e ignorância. Caso qualquer uma destas coisas surjam neles, elas não aumentarão.
E vai além, pois o sábio é capaz de enxergar os fenômenos de acordo com a sua verdadeira característica: dukkha.
Ao compreender a realidade de dukkha, o sábio compreende também que o fenômeno é sofrimento e que a origem deste sofrimento é o desejo por sensualidade e desejo por ser/existir. Logo percebe-se que o fim do sofrimento ocorre pelo abandono deste mesmo desejo e que o método é o Nobre Caminho óctuplo.
Através deste insight três grilhões são abandonados; a ideia da existência de um
eu, dúvida cética e apego a preceitos ou rituais.
Esta nada mais é do que a realização do fruto de Sotapanna, que remove as impurezas associadas a visão incorreta.
Impurezas que devem ser abandonadas pelo autocontrole
O autocontrole é um poderoso método de remoção de impurezas, pois evita com que a mente entre em contato com coisas que a perturbem.
Uma pessoa possui seis portas de contato com o mundo, são elas: visão, audição, olfato paladar, tato e mente. O autocontrole deve ser estabelecido em todas estas seis portas.
Enquanto uma pessoa sem autocontrole faz surgir impurezas, aflições e febres através destas seis portas, um discípulo autocontrolado age com sabedoria, guardando as seis portas e evitando o surgimento de impurezas.
Impurezas que devem ser abandonadas pelo uso
Tem a ver com o uso sábio de coisas materiais. Utilizando-os e possuindo-os somente para proteção, saúde e abrigo, jamais para vaidade, embelezamento, prazer e etc.
Desta forma as impurezas que surgem do uso incorreto de bens materiais não surgem.
Impurezas que devem ser abandonadas com a paciência
As impurezas que devem ser abandonadas com a paciência são relacionadas ao calor, frio, fome, sede, contato com insetos e animais peçonhentos, grosserias, ofensas e sensações desagradáveis no corpo. Aguentar estas coisas sem reclamar é um sinal de que as impurezas foram abandonadas pelo uso da paciência.
Neste caso seria evitar situações que possam gerar conflitos e fofocas. Um discípulo jamais deve se envolver em brigas, intrigas e tampouco colocar sua vida em risco através do contato com animais selvagens e se expor a situações de risco.
Impurezas que devem ser abandonadas pela remoção
É a intolerância com pensamento inábeis que por ventura venham a surgir.
O discípulo sábio compreende que um pensamento inábil surgiu e imediatamente o combate e o remove, para que assim ele não surja no futuro.
Este treinamento evita aflição, febre e a proliferação de impurezas.
Impurezas que devem ser abandonadas com a meditação
É a aplicação dos setes fatores da iluminação (satta bojhanga): atenção plena, investigação dos fenômenos, energia, êxtase, tranquilidade, concentração e equanimidade.
Quem não pratica estes fatores, pode esperar o surgimento de impurezas, aflições e febres.
O Buda conclui o discurso afirmando que aquele que praticou o abandono das impurezas através destes sete métodos é alguém que tem controle sobre as impurezas e atingiu o estágio de Arahant.
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