Um estudo do Ariyapariyesana Sutta

Tempos atrás escrevi um artigo neste blog sobre o Ariyapariyesana Sutta (MN 26 - A Busca Nobre) e nele eu contei sobre a grande inspiração que senti e sinto até hoje, ao ler e refletir sobre este sutta. 
Dando continuidade ao estudo de suttas que estou participando junto com alguns colegas, dei a ideia de estudarmos o Ariyapariyesana Sutta. Por isso, criei este artigo para guiar a leitura do sutta. 

***

Majjhima Nikaya 26
Ariyapariyesana Sutta
A Busca Nobre

A busca do Buda pela Iluminação.
Neste sutta, o Abençoado dá um longo discurso sobre sua busca por Iluminação desde os tempos em que vivia em palácios até o primeiro sermão ao grupo de cinco discípulos.
O sutta começa falando que o Buda morava em Savathi, no Bosque de Jeta, no Parque de Anathapindika. E lá havia um grupo de monges, possivelmente vindos de longe, que demonstraram para Ananda, interesse em ouvir um discurso vindo do próprio Buda. Então Ananda fala que eles deveriam ir até o retiro do Brâmane Rammaka, assim talvez conseguissem ouvir um discurso do Buda.
Os monges se dirigiram para o retiro de Rammaka, enquanto Ananda passou o dia com o Buda no Parque do Oriente, no palácio da Mãe de Migara.
Ao anoitecer, após a meditação, o Buda chama Ananda para ir até o Local de Banhos do Oriente. Ao fim do banho, Ananda elogia o Retiro de Rammaka e convida o Buda para ir até lá por compaixão, o que foi aceito em silêncio pelo Abençoado.
Ao chegarem no local, os monges do começo da história já estavam lá e discutiam o Dhamma, então o Buda entra no recinto e pergunta aos monges qual era o tema da discussão.
Um monge respondeu que o assunto era o próprio Abençoado.
O Buda então fala algo muito importante:

“Bom, bhikkhus. É apropriado que vocês, membros de clãs, que pela fé deixaram a vida em família pela vida santa, se reúnam para discutir o Dhamma. Quando vocês se reunirem, bhikkhus, vocês devem fazer uma de duas coisas: discutir o Dhamma ou observar o nobre silêncio.

Em seguida o Buda inicia a parte central do discurso. Ele fala sobre dois tipos de busca: A busca nobre e a busca ignóbil.
Ele usa a palavra em páli pariyesana, que significa exatamente busca, procura. Dai vem o título do sutta. Ou seja, ariya (nobre) + pariyesana = A Busca Nobre. A busca ignóbil pode ser traduzida como Anariyapariyesana.
O Buda define claramente que há dois caminhos na vida, duas buscas, uma que vai conduzir para a Iluminação e a outra que não vai.
Ele primeiro explica o que é a busca ignóbil:

Alguém que, estando ele mesmo sujeito ao nascimento, busca aquilo que também está sujeito ao nascimento; estando ele mesmo sujeito ao envelhecimento, busca aquilo que também está sujeito ao envelhecimento; estando ele mesmo sujeito à enfermidade, busca aquilo que também está sujeito à enfermidade; estando ele mesmo sujeito à morte, busca aquilo que também está sujeito à morte; estando ele mesmo sujeito à tristeza, busca aquilo que também está sujeito à tristeza; estando ele mesmo sujeito às contaminações, busca aquilo que também está sujeito às contaminações.

Seis categorias de impurezas são citadas: nascimento, envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações.
Então a busca ignóbil é quando alguém tem como foco central na vida a procura por qualquer coisa que possua pelo menos um tipo destas impurezas.  
Em seguida, ele cita muitos exemplos de coisas que se enquadram nestas categorias.

6. “E o que pode ser dito como estando sujeito ao nascimento? Esposa e filhos estão sujeitos ao nascimento, escravos e escravas, bodes e ovelhas, aves e porcos, elefantes, gado, cavalos e éguas, ouro e prata estão sujeitos ao nascimento. Essas aquisições estão sujeitas ao nascimento; e aquele que está preso a essas coisas, apaixonado por elas e totalmente comprometido com elas, estando ele mesmo sujeito ao nascimento, busca aquilo que também está sujeito ao nascimento.
7. “E o que pode ser dito como estando sujeito ao envelhecimento? Esposa e filhos estão sujeitos ao envelhecimento, escravos e escravas, bodes e ovelhas, aves e porcos, elefantes, gado, cavalos e éguas, ouro e prata estão sujeitos ao envelhecimento. Essas aquisições(1) estão sujeitas ao envelhecimento; e aquele que está preso a essas coisas, apaixonado por elas e totalmente comprometido com elas, estando ele mesmo sujeito ao envelhecimento, busca aquilo que também está sujeito ao envelhecimento.
8. “E o que pode ser dito como estando sujeito à enfermidade? Esposa e filhos estão sujeitos à enfermidade, escravos e escravas, bodes e ovelhas, aves e porcos, elefantes, gado, cavalos e éguas estão sujeitos à enfermidade. Essas aquisições estão sujeitas à enfermidade; e aquele que está preso a essas coisas, apaixonado por elas e totalmente comprometido com elas, estando ele mesmo sujeito à enfermidade, busca aquilo que também está sujeito à enfermidade.  
9. “E o que pode ser dito como estando sujeito à morte? Esposa e filhos estão sujeitos à morte, escravos e escravas, bodes e ovelhas, aves e porcos, elefantes, gado, cavalos e éguas estão sujeitos à morte. Essas aquisições estão sujeitas à morte; e aquele que está preso a essas coisas, apaixonado por elas e totalmente comprometido com elas, estando ele mesmo sujeito à morte, busca aquilo que também está sujeito à morte.
10. “E o que pode ser dito como estando sujeito à tristeza? Esposa e filhos estão sujeitos à tristeza, escravos e escravas, bodes e ovelhas, aves e porcos, elefantes, gado, cavalos e éguas estão sujeitos à tristeza. Essas aquisições estão sujeitas à tristeza; e aquele que está preso a essas coisas, apaixonado por elas e totalmente comprometido com elas, estando ele mesmo sujeito à tristeza, busca aquilo que também está sujeito à tristeza.
11. “E o que pode ser dito como estando sujeito às contaminações? Esposa e filhos estão sujeitos às contaminações, escravos e escravas, bodes e ovelhas, aves e porcos, elefantes, gado, cavalos e éguas, ouro e prata estão sujeitos às contaminações. Essas aquisições estão sujeitas às contaminações; e aquele que está preso a essas coisas, apaixonado por elas e totalmente comprometido com elas, estando ele mesmo sujeito às contaminações, busca aquilo que também está sujeito às contaminações. Essa é a busca ignóbil.

Nota 1: Aquisições (Upadhi). É uma palavra de difícil tradução. Literalmente significa algo que está perto de alguém.
Pode ser entendida como “bens”, “posses”. Aqui o Buda se refere a tudo aquilo que possuímos como fonte de apego, seja algo material ou mental.
Pode ser entendida também como o ato de tomar posse, de adquirir.
Então, upadhi é tanto a posse em si quanto a ação de tomar posse. 
A partir destes upadhis, é que construímos a noção de um Eu. Os cinco agregados são um bom exemplo de upadhis.
No verso 19, Nibbāna é chamado de “abandono de todas aquisições” (sabb’upadhipatinissagga), em que a intenção é abranger ambos os significados.
Nirupadhi é o antônimo de upadhi e pode também ser entendido como Nibbāna, ou seja, nirupadhi significa “sem aquisições, “sem posses”.

É o desejo por estas coisas sujeitas ao nascimento, envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações que prende a mente ao saṃsāra, portanto, faz com que a busca por elas seja algo ignóbil, fútil.
Em seguida o Buda contrasta a busca ignóbil com a busca nobre.

12. “E o que é a busca nobre? Nesse caso, alguém que, estando ele mesmo sujeito ao nascimento, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito ao nascimento, busca o que não nasce, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando ele mesmo sujeito ao envelhecimento, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito ao envelhecimento, busca o que não envelhece, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando ele mesmo sujeito à enfermidade, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito à enfermidade, busca o que não se enferma, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando ele mesmo sujeito à morte, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito à morte, busca o imortal, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando ele mesmo sujeito à tristeza, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito à tristeza, busca o que não está sujeito à tristeza, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando ele mesmo sujeito às contaminações, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito às contaminações, busca o que não é contaminado, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna. Essa é a busca nobre.

Fica claro no texto que a única busca nobre é a busca por Nibbāna. Nenhuma busca por qualquer coisa em qualquer lugar dos trinta e um mundos do saṃsāra pode ser uma busca nobre.
A palavra em páli ādināva (perigo) pode ser entendida também como desvantagens, derrota, deficiência e miséria.
Então a primeira coisa que deve ser feita por alguém que sinceramente deseja praticar para alcançar a Iluminação é entender que as coisas que estão sujeitas ao nascimento, envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações são ādināva, então ele vê as desvantagens desta busca fútil e a abandona, buscando aquilo que não está sujeito ao nascimento, envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações, ou seja, Nibbāna. Esta e tão somente esta é a busca nobre.
A frase “a suprema segurança contra o cativeiro” (yogakkhemaṃ) é recorrente na referência a Nibbāna. Em poucas palavras, ela significa “estar de fato livre das amarras”, “liberdade absoluta”. 

A busca pela Iluminação

O Buda contrastou os dois tipos de busca e agora ele vai relatar sua própria experiência nelas, deixando claro que o que ele está ensinando é fruto do que viveu por conta própria.

13. “Bhikkhus, antes da minha iluminação, quando eu ainda era um Bodisatva não iluminado, eu também, estando eu mesmo sujeito ao nascimento, busquei aquilo que também estava sujeito ao nascimento; estando eu mesmo sujeito ao envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações, busquei aquilo que também estava sujeito ao envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações.

Certamente o Buda tinha acesso a todo o luxo que aquela época e lugar poderiam oferecer. Viveu no seio de uma família real e aristocrata. O que não lhe faltavam eram prazeres diversos e atividades da corte com pessoas que viviam a mesma vida.
Contudo isso não lhe trazia paz, ele não se sentia contente com aquilo, o que é um ponto fora da curva, pois naquela época e até mesmo nos dias de hoje uma vida assim é cobiçada por muitas pessoas.
Ele então refletiu:

‘Por que, estando eu mesmo sujeito ao nascimento, busco aquilo que também está sujeito ao nascimento? Por que, estando eu mesmo sujeito ao envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações, busco aquilo que também está sujeito ao envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações? E se eu, estando eu mesmo sujeito ao nascimento, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito ao nascimento, buscasse o que não nasce, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbana. E se eu, estando eu mesmo sujeito ao envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito ao envelhecimento, enfermidade, morte, tristeza e contaminações, buscasse o que não envelhece, o que não está sujeito à enfermidade, o imortal, o que não está sujeito à tristeza, o que não é contaminado, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbana.’

Um tempo depois desta reflexão ele resolve abandonar a vida em família...

 14. “Mais tarde, ainda jovem, um homem jovem com o cabelo negro, dotado com as bênçãos da juventude, na flor da juventude, embora minha mãe e meu pai desejassem outra coisa e chorassem com o rosto coberto de lágrimas, eu raspei meu cabelo e barba, vesti o manto de cor ocre e deixei a vida em família e segui a vida santa.

Embora o Brâmanismo fosse a religião principal e os brâmanes uma casta influente, a sociedade indiana parecia ter certa tolerância com as diversas vertentes de pensamento filosófico e espiritual que pipocavam na época. Até mesmo o ceticismo era exposto abertamente por seus partidários.
Tanto assim, era comum na época do Buda, homens e mulheres, independente da sua casta, abandonarem a família, profissão e bens materiais para se tornarem ascetas, vivendo uma vida de pobreza e prática espiritual nas florestas e cavernas.
Estas práticas eram as mais diversas possíveis: muitos viviam sozinhos, enquanto outros vivam em pequenas comunidades, praticavam meditação, usavam roupas simples, outros andavam pelados, faziam severos jejuns, não tomavam banho, e etc.
Adotando este padrão, o Bodisatva raspou seu cabelo e barba, tirou suas caras roupas, vestiu um manto cor de ocre e então seguiu a vida santa.
Em seguida ele buscou um bom professor, alguém que poderia ensiná-lo o caminho para a libertação.
Ele encontrou um mestre chamado Alara Kalama e manifestou o desejo de viver a vida santa neste Dhamma e disciplina.
É interessante que o texto usa as palavras Dhamma-Vinaya, que são palavras que o Buda mais tarde usaria para definir seu próprio ensinamento.  
Então o que o Buda ensina é o Dhamma, a doutrina, e o Vinaya o código de conduta monástico, porém o sentido original e mais antigo de vinaya é “treinamento”, “curso”, “prática”, enquanto Dhamma seria algum tipo de doutrina filosófica intelectual ou conceitual usada para a busca pela Iluminação.
Então, cada mestre nesta época tinha o seu próprio Dhamma-Vinaya.
Não se sabe ao certo qual o tipo de Dhamma Vinaya usado por Alara Kalama, mas é notório que tinha ênfase na meditação.
Alara Kalama aceita o Bodisatva como discípulo e elogia seu próprio Dhamma-Vinaya:

‘O venerável pode ficar aqui, meu amigo. Este Dhamma é tal que uma pessoa sábia pode em pouco tempo entrar e permanecer nele, compreendendo por si mesmo através do conhecimento direto a doutrina do seu mestre.'

Em outras palavras, Alara Kalama deixa claro que o mestre não é dono do ensinamento. E sim que é apenas alguém que o passa adiante e que os alunos, sendo sábios, podem atingir o mesmo nível de seu mestre.
O Bodisatva rapidamente aprende a teoria do ensinamento de Alara Kalama e afirma com conhecimento e segurança:

 ‘Eu sei e vejo’ – e havia outros que assim também diziam.

Mas ele não estava satisfeito com isso e pensa:

 ‘Não é somente pela mera fé que Alara Kalama declara, “Tendo compreendido por mim mesmo através do conhecimento direto, eu entro e permaneço neste Dhamma.” Com certeza Alara Kalama permanece conhecendo e vendo este Dhamma.’ 

O Bodisatva então pergunta a Alara Kalama:

 ‘Amigo Kalama, de que forma, tendo compreendido por você mesmo com conhecimento direto, você declara que entra e permanece nesse Dhamma?’ 

Alara Kalama responde que sua realização é a Base do Nada(2).

Nota 2: Os suttas descrevem oito tipos de jhānas, que em geral são estados de profunda concentração e tranquilidade.
Existem quatro jhānas materiais (rupa jhāna), que são chamados de primeiro jhanas, segundo jhāna, terceiro jhāna e quarto jhāna, e quatro jhānas imateriais (arūpa samāpatti), que são chamados de base do espaço infinito, base da consciência infinita, base do nada e base da percepção e nem percepção.
A base do Nada é caracterizada pelo desaparecimento da consciência (a consciência de espaço já foi abandonada na base da consciência infinita) e tudo o que resta é o nada, sem nenhuma substância ou objeto para ser notado.
Alara Kalama ensinou sete realizações, culminando na base do nada, a terceira das quatro realizações imateriais.  

Alara Kalama acreditava que esta realização era a própria Iluminação, mas ele estava enganado, e embora essas realizações sejam louváveis do ponto de vista espiritual, elas ainda são mundanas e em si mesmas não conduzem a Nibbāna. 
O Bodisatva reflete e vê que possui as mesmas qualidades de Alara Kalama (fé, energia, atenção plena, concentração e sabedoria) e aplicando seu esforço, em pouco tempo o discípulo havia se igualado ao mestre.
Ele se dirige ao seu mestre e informa sua realização. O velho Alara Kalama parabeniza o jovem Bodisatva:

 ‘É um ganho para nós, meu amigo, um grande ganho para nós, que tenhamos um tal venerável como companheiro na vida santa. Portanto, o Dhamma no qual eu declaro que entro e permaneço, tendo compreendido por mim mesmo através do conhecimento direto, é o Dhamma no qual você declara entrar e permanecer, tendo compreendido por você mesmo através do conhecimento direto. E o Dhamma no qual você declara entrar e permanecer, tendo compreendido por você mesmo através do conhecimento direto, é o Dhamma no qual eu declaro que entro e permaneço, tendo compreendido por mim mesmo através do conhecimento direto. Portanto, você conhece o Dhamma que eu conheço e eu conheço o Dhamma que você conhece. Como eu sou, assim é você; como você é, assim eu sou. Venha, amigo, vamos agora liderar esta comunidade juntos.'

Agora o Bodisatva conhecia o Dhamma que Alara Kalama conhecia, mestre e aluno eram iguais. Com isso, Alara Kalama convida o Bodisatva para que fosse uma espécie de segundo professor e liderasse junto com ele a comunidade a qual pertenciam.

Apesar de ter ficado honrado, o Bodisatva pensou:

‘Este Dhamma não conduz ao desencantamento, ao desapego, à cessação, à paz, ao conhecimento direto, à iluminação, a Nibbana, mas somente ao renascimento na esfera do nada.’

Ele percebeu que ainda não havia alcançado a Iluminação e que esta realização apenas o levaria a nascer na esfera do nada, onde a expectativa de vida é supostamente de 64.000 éons, mas quando esse tempo passar o ser irá falecer e retornar a um outro plano inferior. Assim quem alcança esta realização ainda não está livre do nascimento e morte mas está aprisionado na armadilha de Mara.
Sendo assim, descontente com sua realização e sem ver uma forma de progredir, ele partiu.
Ele encontrou um novo mestre, chamado Uddaka Ramaputta.
O sutta descreve o mesmo padrão ocorrido com Alara Kalama, com exceção de um detalhe.
O comentário do sutta diz que Uddaka era o filho (putta) biológico ou espiritual de Rama. Rama provavelmente já havia falecido antes que o Bodisatva encontrasse Uddaka. Deve ser notado que todas as referências a Rama são feitas no tempo passado e na terceira pessoa e que ao final Uddaka coloca o Bodisatva na posição de mestre. Embora o texto não permita conclusões definitivas, isso sugere que o próprio Uddaka ainda não havia alcançado a quarta realização imaterial.
Mas o Bodisatva alcançou a mesma realização de Rama, ou seja, a esfera da percepção, nem não percepção, isso fez com que Uddaka Ramaputta o convidasse para liderar sozinho aquela comunidade. 
Novamente, apesar da imensa honra, o Bodisatva reflete sobre sua situação e percebe que ainda não havia alcançado a Iluminação, mas somente o renascimento na esfera da percepção, nem não percepção. Descontente, ele parte.
O sutta pula a fase de práticas ascéticas extremas que o Bodisatva empreendeu logo em seguida. Maiores detalhes sobre esta fase podem ser lidos no Mahasaccaka Sutta.
Ainda em busca pela Iluminação, ele encontra um local adequado para sua prática nas terras de Magadha, mais especificamente junto de um rio chamado Uruvela, em Bodhgaya, e lá, após quase morrer, encontra a forma correta de praticar e finalmente realiza o Imortal...

A iluminação, o resultado do fim da busca ignóbil  

18. “Então, bhikkhus, estando eu mesmo sujeito ao nascimento, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito ao nascimento, buscando o que não nasce, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna, eu alcancei o que não nasce, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando eu mesmo sujeito ao envelhecimento, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito ao envelhecimento, buscando o que não envelhece, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna, eu alcancei o que não envelhece, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando eu mesmo sujeito à enfermidade, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito à enfermidade, buscando o que não está sujeito à enfermidade, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna, eu alcancei o que não está sujeito à enfermidade, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando eu mesmo sujeito à morte, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito à morte, buscando o imortal, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna, eu alcancei o imortal, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando eu mesmo sujeito à tristeza, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito à tristeza, buscando o que não está sujeito à tristeza, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna, eu alcancei o que não está sujeito à tristeza, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna; estando eu mesmo sujeito às contaminações, tendo compreendido o perigo daquilo que está sujeito às contaminações, buscando o que não está sujeito às contaminações, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna, eu alcancei o que não está sujeito às contaminações, a suprema segurança contra o cativeiro, Nibbāna. Surgiram em mim a visão e o conhecimento: ‘Inabalável é a libertação da minha mente. Este é o último nascimento. Não há mais vir a ser a nenhum estado.’

Desnecessário dizer que aqueles que alcançaram a realização da busca nobre jamais reverterão para a busca ignóbil. É um caminho sem volta.
Ele continua:

19. “Eu pensei: ‘Este Dhamma que eu alcancei é profundo, difícil de ver e difícil de compreender, pacífico e sublime, que não pode ser alcançado através do mero raciocínio, ele é sutil, para ser experimentado pelos sábios. Mas, esta população se delicia com a adesão(3), está excitada com a adesão, desfruta da adesão. É difícil para uma população como esta ver esta verdade, isto é, a condicionalidade isto/aquilo e a origem dependente. E também é difícil de ver esta verdade, isto é, o cessar de todas as formações, o abandono de todas aquisições, o fim do desejo, desapego, cessação, Nibbana. Se eu fosse ensinar o Dhamma, os outros não me entenderiam e isso seria fatigante, problemático para mim.

Nota 3: Em páli ālaya pode significar o objeto de apego. A palavra também pode significar o covil de um animal, ou seja, um local onde se busca segurança e conforto, um lar.
Então a perspectiva do Buda é que a população do mundo se delicia com ālaya, está acomodada em ālaya e tem ālaya como refúgio.

O Dhamma a qual ele se refere é Origem Dependente e as as Quatro Nobres Verdades, algo que era desconhecido de todos no mundo.
Ainda sentado sob a Árvore Bodhi, vendo o profundo obscurecimento espiritual da população, o Buda percebe que é difícil para eles perceberem este sútil Dhamma que até para ele foi difícil alcançar. Ele conclui que as pessoas não o entenderiam e que o ensino seria algo cansativo e problemático.
O Buda estava tendendo ao silêncio e isso é claro nestes bonitos porém dramáticos versos:

‘Basta com a ideia de ensinar o Dhamma
que até para mim foi difícil alcançar;
pois ele nunca será entendido
por aqueles que vivem com a cobiça e a raiva.
Aqueles tingidos pela cobiça, envoltos na escuridão
nunca irão discernir este Dhamma difícil de ser compreendido
que vai contra a torrente do mundo,
sutil, profundo e difícil de ser visto.’

Pensando dessa forma, minha mente tendia à inação ao invés do ensino do Dhamma(4).


Nota 4: O comentarista coloca a questão, devido ao fato do Bodisatva há muito tempo ter tido o desejo de alcançar o estado de Buda para libertar os outros seres, por que agora a sua mente se inclinava para a inação? A razão, diz o comentarista, é que somente agora, depois de alcançar a iluminação, ele reconheceu plenamente a força das impurezas nas mentes das pessoas e a profundidade do Dhamma. E ele queria também que Brahma lhe implorasse para ensinar para que os seres que veneram Brahma reconhecessem o precioso valor do Dhamma e desejassem ouvi-lo.

Foi quando o Brahma Sahampati, uma alta figura celestial, soube que o Buda não desejava ensinar o Dhamma para ninguém, percebendo o perigo disso, rapidamente se dirigiu a ele na tentativa de convencê-lo a ensinar.

‘Venerável senhor, que o Abençoado ensine o Dhamma, que o Iluminado ensine o Dhamma. Há seres com pouca poeira sobre os olhos que estão decaindo por não ouvir o Dhamma. Há aqueles que entenderão o Dhamma.’
(...)
‘Em Magadha surgiram até agora
ensinamentos contaminados formulados por aqueles que ainda estão poluídos.
Abram as portas para o Imortal! Que eles ouçam
o Dhamma que o Imaculado encontrou.
Tal como alguém que esteja no pico de uma montanha
é capaz de ver todas as pessoas embaixo,
da mesma forma, Oh, sábio, sábio que tudo vê,
suba ao palácio do Dhamma.
Que o Conquistador da Tristeza inspecione esta raça humana,
engolfada na tristeza, subjugada pelo nascimento e envelhecimento.
Levante-se, Oh herói, vitorioso na batalha!
Oh, líder da caravana, sem dívidas, saia pelo mundo.
Ensine o Dhamma, Oh, Abençoado:
Existem aqueles que irão compreender.’

O Abençoado ouve os apelos do Brahma e com compaixão realiza uma observação mais detalhada do mundo com o olho de um Buda.
Ele encontra seres dos mais vários tipos. Com pouca poeira sobre os olhos e com muita poeira sobre os olhos, com faculdades aguçadas e com faculdades embotadas, com boas qualidades e com más qualidades, fáceis de serem ensinados e difíceis de serem ensinados e alguns que permaneciam sentindo medo e responsabilidade pelo outro mundo(5).

Nota 5:  medo e responsabilidade pelo mundo significa ver o perigo do nascimento em qualquer lugar, mesmo no paraíso.

Ele prossegue com um belo símile:

Tal como num lago com flores de lótus azuis ou vermelhas ou brancas, algumas flores de lótus nascem e crescem na água e prosperam imersas na água sem sair fora da água, enquanto que algumas outras flores de lótus nascem e crescem na água e pousam sobre a superfície da água, e ainda, algumas outras flores de lótus nascem e crescem na água e sobem acima do nível da água permanecendo sem serem molhadas pela água; assim também, inspecionando o mundo com o olho de um Buda, eu vi seres com pouca poeira sobre os olhos e com muita poeira sobre os olhos, com faculdades aguçadas e com faculdades embotadas, com boas qualidades e com más qualidades, fáceis de serem ensinados e difíceis de serem ensinados e alguns que permaneciam sentindo medo e responsabilidade pelo outro mundo.

Usando uma linguagem fria e técnica, podemos classificar os seres nas seguintes categorias:

Padaparama: O nível mais baixo. São cegos e inúteis. Vivem na total escuridão, e além de serem incapazes de alcançar a Iluminação, não ganharam nada para melhorar suas perspectivas de futuro. A morte para tais pessoas é uma morte sem distinção.
Só há uma direção possível que elas podem ir: para baixo. E elas caem cada vez mais com cada morte sucessiva. O caminho para cima é bloqueado, pois não ganharam absolutamente nada benéfico para levar junto com elas.
Neyya: Podem ser treinadas no caminho do Dhamma. Às vezes progridem, às vezes perdem o caminho. São plenamente capazes de entender o ensino e colocá-lo em prática, porém podem ser perder se forem descuidados. Mas se eles são sérios em sua prática, eles podem progredir rapidamente.
Dependendo do grau de compromisso, neyya pode ir em ambas as direções.
Vipacitaññu: Sempre progridem em direção ao objetivo; eles nunca se perdem, mas seu desenvolvimento pode ser lento ou rápido.
Ugghatitaññu: São indivíduos cuja sabedoria intuitiva é tão afiada que eles estão sempre totalmente preparados para fazer um avanço decisivo. Se fossem gados, estariam esperando na porteira do curral. Assim que a porteira se abrisse, eles saíram correndo. Ugghatitaññu são capazes do tipo de compreensão rápida que lhes permite ir além em um momento de insight.
É este tipo de pessoa que o Buda procura para dar seu primeiro ensinamento.

E conclue:

Para eles estão abertas as portas para o Imortal,
que aqueles com ouvidos mostrem agora a sua fé.
Pensando que seria problemático, Oh Brahma,
eu não quis falar o Dhamma sutil e sublime.’

Agora o Buda estava convencido que deveria ensinar e o Brahma fica satisfeito por ter feito o Buda considerar o ensino.
O Buda então pensou para quem ele deveria ensinar o Dhamma primeiramente.
Ele cogitou ensinar seu antigo mestre Alara Kalama, pois sabia que ele tinha capacidade de entender com rapidez, mas foi alertado pelos devas de que Alara Kalama havia morrido há sete dias. Sendo isso uma perda significativa, pois Alara Kalama certamente teria entendido facilmente o Dhamma.
O Buda então pensou em Uddaka Ramaputta, que também tinha capacidade de entendimento do Dhamma, mas soube pelos devas que Uddaka também havia morrido, justamente na noite anterior. Era uma outra perda significativa de alguém com imenso potencial.
Continuando sua investigação, viu que os seus antigos companheiros de prática ascética, o grupo de cinco bhikkhus, eram capazes de entender o Dhamma. Com o olho divino, o Buda viu que eles estavam vivendo em Benares, no Parque do Gamo, em Isipatana, distante 245 Km.
Foi para eles que o Buda proferiu seu primeiro discurso, conforme relata o Dhammacakkappavattana sutta.

O ensinamento do Dhamma

Ele continua seu relato contando o início da longa viagem até Benares.
No caminho ele encontra um homem chamado Ajivaka Upaka, que se surpreende com o semblante pacífico do Buda.

 ‘Amigo, as suas faculdades estão claras, a sua complexão está pura e brilhante. Sob qual mestre você adotou a vida santa, amigo? Quem é o seu mestre? Qual Dhamma você professa?’ 

O Buda então responde com estes magníficos versos:

‘Eu sou aquele que transcendeu tudo, aquele que tudo conhece,
imaculado entre todas as coisas, renunciando a tudo,
libertado pela cessação do desejo. Tendo conhecido tudo isso
por mim mesmo, a quem devo apontar como mestre?
Eu não tenho mestre, e outro como eu
não existe em nenhum lugar do mundo,
com todos os seus devas, porque não tenho
outra pessoa como equivalente.
Eu sou o Consumado no mundo,
eu sou o Mestre Supremo.
Eu sozinho sou um Perfeitamente Iluminado
cujo fogo está saciado e extinto.
Eu vou agora para Kasi (Benares)
para colocar a Roda do Dhamma em movimento.
Num mundo que se tornou cego
eu vou proclamar o Imortal.’

‘Pela sua declaração, amigo, você deve ser o Vitorioso Universal.’

‘Os vitoriosos são como eu
que venceram destruindo as contaminações.
Eu derrotei todos os estados ruins,
portanto, Upaka, eu sou um vitorioso.’

“Quando isso foi dito, o Ajivaka Upaka disse: ‘Pode ser que assim seja, amigo.’ Balançando a cabeça, ele tomou um desvio e partiu.

Parece que Upaka embora estivesse surpreso, principalmente por jamais ter visto alguém com tal semblante, não se convenceu totalmente da realização máxima do Buda. Talvez ele não imaginasse que alguém tão jovem, como o Buda na época, pudesse ter alcançado a suprema realização espiritual e sem sequer ter um mestre.
O Comentário diz que tempos depois, após um casamento malsucedido, Upaka procurou o Buda e tornou-se um Anāgāmi. Após a morte alcançou Nibbāna nas Moradas Puras. Sua antiga esposa e o filho posteriomente entraram na vida monástica e alcançaram a Iluminação.  
Finalmente, o Buda chega no Parque do Gamo e encontra o grupo de cinco bhikkhus.
Por acharem que o Buda havia relaxado na sua prática, eles se negaram a prestar homenagens e respeito a ele. Mas permitiram que se juntasse ao grupo.
Os bhikkhus forem gentis, porém continuaram a tratá-lo pelo termo “amigo” (āvuso), ou seja, alguém que tem a mesma posição social.
O Buda alerta:

‘Bhikkhus, não se dirijam ao Tathagata pelo nome e como ‘amigo.’ O Tathagata é um arahant, perfeitamente iluminado. Ouçam bhikkhus, o Imortal foi alcançado. Eu os instruirei, eu lhes ensinarei o Dhamma. Praticando da forma instruída, realizando por vocês mesmos através do conhecimento direto vocês logo entrarão e permanecerão no objetivo supremo da vida santa pelo qual membros de clãs abandonam a vida em família pela vida santa.’

Além de um alerta, esta mensagem é um convite para que os bhikkhus aceitem o que o Buda tem para ensinar. E este ensino nada mais era do que o caminho para o Imortal, aquilo que há anos eles tanto procuravam.
Mesmo assim os bhikkhus não entenderam e não aceitaram que o Buda ensinasse e o questionaram.

‘Amigo Gotama, através da conduta, da prática e da realização das austeridades às quais você se dedicou, você não alcançou nenhum estado supra-humano, nenhuma distinção em conhecimento e visão digna dos nobres. Como agora você vive gratificado pelos sentidos, tendo deixado de lado a sua busca e revertido ao luxo, como poderia você ter atingido algum estado supra-humano, alguma distinção em conhecimento e visão dignos dos nobres?’ 

Mas o Buda responde, de forma impessoal, usando o termo Tathagata:

 ‘O Tathagata não vive gratificado pelos sentidos, nem deixou de lado a sua busca e reverteu ao luxo. O Tathagata é um arahant, perfeitamente iluminado. Ouçam bhikkhus, o Imortal foi alcançado ... abandonam a vida em família pela vida santa.’

Os bhikkhus insistem no questionamento, e o Buda novamente responde a mesma coisa.
Um terceiro questionamento ocorre e o Buda muda drasticamente a resposta.

‘Bhikkhus, vocês já me viram falar desta forma antes?’ – ‘Não, venerável senhor.’ – ‘Bhikkhus, o Tathagata é um arahant, perfeitamente iluminado. Ouçam bhikkhus, o Imortal foi alcançado. Eu os instruirei, eu lhes ensinarei o Dhamma. Praticando da forma instruída, realizando por vocês mesmos através do conhecimento direto vocês logo entrarão e permanecerão no objetivo supremo da vida santa pelo qual membros de clãs abandonam a vida em família pela vida santa.’

Quando o Buda falou isso, os bhikkhus devem ter entendido que um Buda era sempre perfeitamente sincero e que jamais mentiria. A partir deste ponto, os bhikkhus já não o chamam mais de amigo (āvuso), e sim de Venerável Senhor (Bhante). O que significa que agora eles o aceitaram como mestre, ou seja, alguém em uma posição superior.
O texto repete que o Imortal havia sido alcançado e que agora o Buda lhes ensinaria o Dhamma.
A partir deste ponto, o Buda profere seu primeiro discurso.
Após algumas semanas de treinamento na floresta sob a tutela do Buda, todos os cinco bhikkhus tornaram-se Arahants.
Ele repete a sentença do abandono da busca ignóbil para se referir a Iluminação dos cinco bhikkhus.

Prazer sensual

Para finalizar o sutta, o Buda explica os cinco elementos do prazer sensual e critica aqueles que se deleitam com a sensualidade. Utilizando um símile para demonstrar como o apego a sensualidade é perigoso, fazendo com que a pessoa seja presa fácil de Mara.

31. ‘Bhikkhus, existem esses cinco elementos do prazer sensual. Quais são os cinco? Formas percebidas pelo olho que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostadas, conectadas com o desejo sensual e que provocam a cobiça. Sons percebidos pelo ouvido ... Aromas percebidos pelo nariz ... Sabores percebidos pela língua ... Tangíveis percebidos pelo corpo que são desejáveis, agradáveis e fáceis de serem gostados, conectados com o desejo sensual e que provocam a cobiça. Esses são os cinco elementos do prazer sensual.
32. “Quanto a esses contemplativos e brâmanes que estão atados a esses cinco elementos do prazer sensual, apaixonados por eles e totalmente comprometidos com eles e que os utilizam sem ver o perigo que eles contêm ou sem compreender como escapar deles, desses contemplativos e brâmanes se pode compreender o seguinte: ‘Eles encontraram a calamidade, encontraram o desastre, o Senhor do Mal poderá fazer deles o que quiser.’ Suponham um gamo da floresta que esteja atado preso numa armadilha; dele se pode compreender o seguinte: ‘Ele encontrou a calamidade, encontrou o desastre, o caçador poderá fazer dele o que quiser.’ Assim também com relação àqueles contemplativos e brâmanes que estão atados a esses cinco elementos do prazer sensual ... deles se pode compreender o seguinte: ‘Eles encontraram a calamidade, encontraram o desastre, o Senhor do Mal poderá fazer deles o que quiser.’

Em seguida o Buda ensina como alguém que não está apegado ao desejo sensual consegue escapar da armadilha de Mara.

33. “Quanto a esses contemplativos e brâmanes que não estão atados a esses cinco elementos do prazer sensual, que não estão apaixonados por eles nem totalmente comprometidos com eles e que os utilizam vendo o perigo que eles contêm, compreendendo como escapar deles, desses contemplativos e brâmanes se pode compreender o seguinte: ‘Eles não encontraram a calamidade, não encontraram o desastre, o Senhor do Mal não poderá fazer deles o que quiser.’ Suponham um gamo da floresta que não esteja atado, preso numa armadilha; dele se pode compreender o seguinte: ‘Ele não encontrou a calamidade, não encontrou o desastre, o caçador não poderá fazer dele o que quiser, e quando o caçador vier o gamo poderá ir onde quiser.’ Assim também com relação àqueles contemplativos e brâmanes que não estão atados a esses cinco elementos do prazer sensual ... deles se pode compreender o seguinte: ‘Eles não encontraram a calamidade, não encontraram o desastre, o Senhor do Mal não poderá fazer deles o que quiser.’
34. “Suponham um gamo da floresta que perambula pela região inexplorada da floresta: ele caminha sem medo, fica em pé sem medo, senta sem medo, deita sem medo. Por que isso? Porque ele se encontra fora do alcance do caçador. Assim também, um bhikkhu afastado dos prazeres sensuais, afastado das qualidades não hábeis, entra e permanece no primeiro jhana, que é caracterizado pelo pensamento aplicado e sustentado, com o êxtase e felicidade nascidos do afastamento. Este bhikkhu, diz-se que vendou os olhos de Mara, se tornou invisível para o Senhor do Mal ao privar o olho de Mara da sua oportunidade.

Ele agora profere a explicação padrão dos jhānas. Começando pelo primeiro jhāna até a base da cessação da percepção e sensação, sempre enfatizando no final de cada fase que este bhikkhu vendou os olhos de Mara e não possui nenhum medo.
É o fim do discurso e a audiência de bhikkhus finalmente havia conseguido após tanto tempo ouvir o Buda, cujas palavras os deixaram satisfeitos e contentes.



Agora proponho algumas reflexões para o leitor. 

- De quais formas poderia ser útil ou não para você distinguir entre a busca nobre e ignóbil ao olhar sua própria vida? 
- O que você acha da hesitação do Buda para ensinar? Você concorda que o Dhamma seja difícil de ver e entender? Se assim for, por que percebe desta forma? 
- Você acha que alcançar a "suprema segurança contra o cativeiro" é um objetivo possível na sua vida? O que você pensa sobre Nibānna?
- Se você fosse encontrar o Buda, como se dirigiria a ele? Ofereceria a ele alguma forma de respeito? Quais?

Referências:

Ajahn Maha Bua – O Caminho para a Iluminação; página 65.

Comentários do Ariyapariyesana Sutta.

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