Cinco primeiros grilhões e os quatro jhanas
Majjhima Nikaya 64
Mahamalunkya Sutta
O Grande Discurso para Malunkyaputta
(...)
Em Savatthi. “Bhikkhus, há esses cinco primeiros grilhões. Quais cinco? A idéia da existência de um eu, a dúvida, o apego a preceitos e rituais, desejo sensual e a má vontade. Esses são os cinco primeiros grilhões. Os quatro fundamentos da atenção plena devem ser desenvolvidos para o conhecimento direto desses cinco primeiros grilhões, para a sua completa compreensão, para a sua total destruição e para o seu abandono.”
“E qual, Ananda, é o caminho, a prática, para o abandono dos cinco primeiros grilhões? Aqui, um bhikkhu afastado das aquisições, com o abandono dos estados prejudiciais, com a completa tranqüilização da resistência corporal, afastado dos prazeres sensuais, afastado das qualidades não hábeis, entra e permanece no primeiro jhana, que é caracterizado pelo pensamento aplicado e sustentado, com o êxtase e felicidade nascidos do afastamento.
“Tudo que ali existe de forma material, sensação, percepção, formações volitivas e consciência, ele vê esses estados como impermanentes, como sofrimento, como uma enfermidade, um tumor, uma flecha, uma calamidade, uma aflição, estranhos, desintegrando, vazios, como não-eu. Ele afasta a sua mente desses estados e a dirige para o elemento imortal, desta forma: ‘Isto é a paz, isto é o sublime, isto é, o silenciar de todas as formações, o abandono de todas as aquisições, a destruição do desejo, desapego, cessação, Nibbana.’ Firmando-se sobre isso, ele realiza a destruição das impurezas. Mas se ele não realizar a destruição das impurezas, então devido a esse desejo pelo Dhamma, esse deleite com o Dhamma, com a destruição dos cinco primeiros grilhões ele se tornará um dos que irá renascer de forma espontânea nas Moradas Puras e lá realizará o parinibbana sem nunca mais retornar desse mundo. Esse é o caminho, a prática para o abandono dos cinco primeiros grilhões.
“Além disso, abandonando o pensamento aplicado e sustentado, um bhikkhu entra e permanece no segundo jhana, que é caracterizado pela segurança interna e perfeita unicidade da mente, sem o pensamento aplicado e sustentado, com o êxtase e felicidade nascidos da concentração. Além disso, abandonando o êxtase um bhikkhu ... entra e permanece no terceiro jhana, caracterizado pela felicidade sem o êxtase, acompanhada pela atenção plena, plena consciência e equanimidade. Além disso, com o completo desaparecimento da felicidade, um bhikkhu entra e permanece no quarto jhana, que possui nem felicidade nem sofrimento, com a atenção plena e a equanimidade purificadas.
“Tudo que ali existe de forma material, sensação, percepção, formações volitivas e consciência, ele vê esses estados como impermanentes ... como não-eu. Ele afasta a sua mente desses estados e a dirige para o elemento imortal ... Esse é o caminho, a prática para o abandono dos cinco primeiros grilhões.
“Além disso, com a completa superação das percepções da forma, com o desaparecimento das percepções do contato sensorial, sem dar atenção às percepções da diversidade, consciente que o ‘espaço é infinito,’ um bhikkhu entra e permanece na base do espaço infinito.
“Tudo que ali existe de sensação, percepção, formações volitivas e consciência, ele vê esses estados como impermanentes ... como não-eu. Ele afasta a sua mente desses estados e a dirige para o elemento imortal ... Esse é o caminho, a prática para o abandono dos cinco primeiros grilhões.
“Além disso, com a completa superação da base do espaço infinito, consciente de que a ‘consciência é infinita,’ um bhikkhu entra e permanece na base da consciência infinita.
“Tudo que ali existe de sensação, percepção, formações volitivas e consciência, ele vê esses estados como impermanentes ... como não-eu. Ele afasta a sua mente desses estados e a dirige para o elemento imortal ... Esse é o caminho, a prática para o abandono dos cinco primeiros grilhões.
. “Além disso, com a completa superação da base da consciência infinita, consciente de que ‘não há nada,’ um bhikkhu entra e permanece na base do nada.
Fundamentos da Atenção Plena
Uma explicação dos quatro fundamentos da atenção plena que - para aqueles que os colocam em prática - são um meio para obter a libertação das contaminações:
I. Kayanupassana satipatthana: estar plenamente atento em relação ao corpo como um fundamento da atenção plena.
II. Vedananupassana satipatthana: estar plenamente atento em relação às sensações como um fundamento da atenção plena.
III. Cittanupassana satipatthana: estar plenamente atento em relação à mente como um fundamento da atenção plena.
IV. Dhammanupassana satipatthana: estar plenamente atento em relação aos objetos mentais como um fundamento da atenção plena.
Para usar esses quatro fundamentos como um meio para centralizar a mente, você precisa primeiro se familiarizar com as três qualidades descritas a seguir.
Sati: atenção plena; a faculdade de estar acompanhando um objeto .
Sampajañña: plena consciência. Esta tem que estar firmemente estabelecida antes que a atenção plena possa ser enviada para acompanhar um objeto - como o corpo - e depois trazê-la de volta internamente para dirigi-la ao coração.
Atappa: investigação concentrada que analisa o objeto em seus vários aspectos.
Os objetos pelos quais a investigação concentrada, a plena consciência e a atenção plena são responsáveis, cada um de forma separada. São quatro os objetos -
1. O corpo (kaya): que é um conglomerado dos quatro elementos terra, água, fogo e ar.
2. Sensações (vedana): a experiência de sensações, como prazerosas, dolorosas e indiferentes.
3. A mente (citta): que é aquilo que armazena as várias formas do bem e do mal.
4. Objetos Mentais (dhamma): condições que possuem natureza própria, tal como as qualidades hábeis ou inábeis que se mesclam na mente.
Existem quatro níveis de estados mentais bons --
1. Kamavacara-bhumi: o nível da sensualidade.
2. Rupavacara-bhumi: o nível da forma.
3. Arupavacara-bhumi: o nível sem forma.
4. Lokuttara-bhumi: o nível transcendente.
1. O nível da sensualidade: Um estado mental surge e se conecta com um objeto benéfico e hábil - qualquer visão, som, aroma, sabor, tangível ou idéia que possa formar a base para estados mentais benéficos e hábeis. Quando a mente se encontra com o seu objeto, ela fica feliz, alegre e contente. (Neste caso estamos nos referindo aos objetos sensuais que são bons para a mente). Se você fosse se referir aos Paraísos da Felicidade Sensual da forma como eles aparecem dentro de cada um de nós, a lista seria a seguinte: Visões que podem formar a base para estados mentais benéficos e hábeis representam um nível, sons representam outro, e o mesmo se aplica aos aromas, sabores, tangíveis e idéias. Juntos elas formam os seis níveis do paraíso no nível da sensualidade.
2. O nível da forma: Um estado mental surge por pensar em (vitakka) um objeto físico que serve como tema da meditação; depois, a análise (vicara) do objeto sob os seus vários aspectos, ao mesmo tempo assegurando que a mente não escape do objeto (ekaggatarammana). Quando a mente e o seu objeto se unificam desta forma, o objeto se transforma em luminosidade. A mente fica descarregada e pode relaxar de suas preocupações. O êxtase (piti) e a felicidade (sukha) surgem como resultado. Quando esses cinco fatores surgem na mente, ela entrou no primeiro nível de jhana - o estágio inicial no nível da forma.
3. O nível sem forma: A mente se solta do seu objeto físico no nível da forma, mas ainda está apegada a uma noção mental muito sutil - o jhana do espaço infinito, por exemplo, em que você está focado numa sensação de vazio sem que nenhum objeto físico ou imagem passe pelo seu campo de atenção, de forma que você é incapaz de conhecer toda a sua extensão. O que na verdade aconteceu é que você se encolheu e está escondido internamente. Este não é o tipo "ir para dentro para conhecer" que surge ao realizar o seu trabalho. É o "ir para dentro para conhecer" que surge de querer fugir. Você viu os defeitos do que surge fora de você, mas você não viu que na verdade eles estão enterrados dentro de você - assim você se escondeu internamente pela limitação do seu campo de atenção.
Algumas pessoas, quando alcançam este ponto, acreditam que elas eliminaram as impurezas, porque elas confundem o vazio com nibbana. Na verdade, esse é somente o primeiro estágio no nível sem forma e assim ainda se encontra no plano mundano.
Se você realmente quiser saber se a sua mente está no nível mundano ou transcendente, observe-a quando você dirigir a atenção internamente e ela se tranqüilizar - sentindo uma sensação de paz e tranqüilidade que pareça não possuir nenhuma impureza que a esteja adulterando. Solte-se desse estado mental para ver como ela se comporta por si mesma. Se as impurezas conseguirem reaparecer, você ainda estará no plano mundano. Algumas vezes esse estado mental permanece inalterado pela força do seu próprio esforço, mas após algum tempo você fica inseguro em relação ao seu entendimento. A sua mente continua se manifestando, isto é, fazendo comentários. Se for esse o caso, não acredite que o seu entendimento seja verdadeiro.
Existem muitos, muitos tipos de conhecimentos: O intelecto sabe, o coração sabe, a consciência sabe, o discernimento sabe, a plena consciência sabe, a atenção sabe, a falta de atenção sabe. Todos esses tipos se baseiam em conhecimento; eles diferem entre si apenas na forma como sabem. Se você não for capaz de claramente distinguir entre os diferentes tipos de conhecimento, o entendimento pode ficar confuso - e assim você pode tomar o entendimento incorreto como sendo entendimento correto, ou a não consciência como consciência, ou o conhecimento baseado em suposições (sammuti) como o conhecimento livre de suposições (vimutti). Portanto, você deve experimentar e examinar as coisas com cuidado sob todos os ângulos, de forma que você possa ver por si mesmo que tipo de entendimento é o genuíno e qual é o falso. O falso entendimento apenas sabe mas não é capaz do abandono. O entendimento verdadeiro, quando se empenha em saber algo, já está preparado para abandonar.
Todos os três níveis da mente apresentados até agora estão no plano mundano.
4. O nível transcendente: Ele inicia com o caminho e o fruto de entrar na correnteza em direção a nibbana. Aqueles que atingiram este nível começaram seguindo o treinamento tríplice da virtude, concentração e sabedoria no nível mundano e daí continuaram para conquistar o primeiro verdadeiro insight das Quatro Nobres Verdades, o que fez com que eles se libertassem dos três primeiros grilhões (samyojana). Dessa forma, as suas mentes foram libertadas na correnteza em direção a nibbana. Os três grilhões são -
a. Idéia da existência de um eu (sakkaya-ditthi): a idéia que nos faz acreditar que o corpo nos pertence.
b. Dúvida (vicikiccha): a incerteza que nos faz ficar inseguros sobre se aquilo em que acreditamos é realmente bom - isto é, quanto de verdade existe em relação ao Buda, ao Dhamma e à Sangha.
c. Apego a preceitos e rituais (silabbata-paramasa): Afeição pelo bem que praticamos; apego àquelas formas de bondade que são apenas externas, por exemplo, observar preceitos ou rituais apegando-se simplesmente ao nível da ação com o corpo ou com a linguagem. Exemplos dessa atitude incluem coisas tais como o desenvolvimento da virtude somente através da adesão aos preceitos; praticar a concentração simplesmente sentado como se fosse um poste; não ser capaz de se livrar dessas ações, sempre se agarrando à bondade que deriva delas, feliz quando tem a oportunidade de realizá-las de um modo particular, descontente quando não pode; pensar por exemplo, que a virtude é algo obtido dos monges quando eles lhe dão os preceitos; que os oito preceitos são para serem observados somente em certos dias e noites, meses e anos; que você ganha ou perde mérito simplesmente como resultado de ações externas ligadas às crenças com as quais você está habituado. Nenhuma dessas atitudes atinge a essência da virtude. Elas não vão além do simples apego a crenças, hábitos e convenções; agarrando-se a essas formas de bondade, sempre demonstrando afeição por elas, incapaz de se soltar delas. Portanto, a isto chamamos de "apego a preceitos e rituais".
A palavra "mente" abrange três aspectos:
(1) A natureza primária da mente.
(2) Estados mentais.
(3) Estados mentais em interação com os seus objetos.
Todos esses aspectos, tomados em conjunto, compõem a mente. Se você não conhecer a mente desta forma, você não poderá dizer que realmente a conhece. Tudo que você poderá fazer é dizer que a mente surge e desaparece, a mente não surge ou desaparece; a mente é boa, a mente é má; a mente se destrói, não se destrói; a mente é um dhamma, a mente não é um dhamma; a mente conquista a libertação, a mente não conquista a libertação; a mente é nibbana, a mente não é nibbana; a mente é a consciência sensorial, a mente não é a consciência sensorial; a mente é o coração, a mente não é o coração...
Conforme ensinado pelo Buda, existem apenas dois caminhos para a prática - o corpo, a linguagem e o coração; ou o corpo, a linguagem e a mente - e ao final ambos os caminhos chegam ao mesmo ponto: o seu verdadeiro objetivo é a libertação. Portanto, se você quiser conhecer a verdade sobre qualquer um dos assuntos acima, você terá que seguir o caminho e alcançar a verdade por si mesmo. De outro modo, você cairá em discussões intermináveis. Esses assuntos - para aquelas pessoas que não praticaram até alcançar o insight claro - são caracterizados pelas pessoas sábias como sedamocana-katha: assuntos que farão apenas com que você transpire muito.
Portanto, eu gostaria de dar uma breve explicação: A natureza primária da mente é a qualidade que simplesmente sabe. O fluxo que pensa e flui para fora do 'saber' para os vários objetos é um estado mental. Quando esse fluxo se conecta com os seus objetos e se encanta com eles, ele se torna uma contaminação, obscurecendo a mente: esse é o estado mental em interação. Os estados mentais, por si mesmos e em interação, quer sejam benéficos ou prejudiciais, têm que surgir, têm que desaparecer, têm que se dissolver por sua própria natureza. A fonte de ambos os tipos de estados mentais é a natureza primária da mente, que nem surge e nem desaparece. É um fenômeno fixo (thiti-dhamma), sempre presente. Por natureza primária da mente - que é chamada de "pabhassara," ou luminosa - eu quero dizer o estado normal e elementar do saber no presente. Mas quem não é capaz de penetrá-la para conhecê-la não poderá obter nenhum benefício dela, como a história do macaco com o diamante. Por isso, o nome dado pelo Buda para descrever esse tipo de coisas é realmente adequado: avijja- entendimento obscurecido, falso entendimento. Isto está de acordo com os termos "pubbante aññanam" - não conhecer o início, isto é, a natureza primária da mente; "parante aññanam" - não conhecer o fim, isto é, os estados mentais em interação com os seus objetos; "majjhantika aññanam" - não conhecer o meio, isto é, o fluxo que flui da natureza primária do saber. Quando esse é o caso, a mente se torna um sankhara: fazendo invenções, fazendo mágicas, fabricando em abundância nas mais variadas formas.
muito bom!
ResponderExcluirobrigado
Não foi nada.
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